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Foto: Nelson Batista / O Tempo
Manifestantes foram até a Câmara Municipal de Betim, na manhã desta terça-feira (20 de maio), protestar contra o adiamento da distribuição de um material didático produzido à pedido da Prefeitura de Betim que aborda a história e a cultura afro-brasileira e indígena nas escolas da rede pública municipal. A suspensão temporária da entrega dos materiais gerou indignação entre professores, ativistas e representantes de movimentos sociais, que acusam parte dos vereadores de tentarem barrar avanços na educação antirracista.
Durante a manifestação, os ânimos ficaram exaltados e houve momentos de tensão. Alguns parlamentares chegaram a discutir diretamente com os manifestantes, que ocuparam a plenária com cartazes e palavras de ordem. A principal crítica dos manifestantes é à atuação de uma ala da Câmara que, na semana ada, solicitou à prefeitura mais esclarecimentos sobre o conteúdo do programa, especialmente em relação a possíveis interpretações religiosas.
Para a deputada estadual Andréia de Jesus (PT), a possibilidade da suspensão da distribuição do material didático é inconstitucional e um medida racista. "Está previsto em lei federal que as escolas trabalhem a história afro-brasileira e dos indígenas nas salas de aula. Este material foi produzido com o apoio da sociedade civil, haverá formação para os professores. Então, a suspensão, sem justificativa científica, por mera vontade política de grupos isolados, é um ato grave e precisa ser revisto", asseverou a parlamentar.
Agente cultural e cantor de rapper mineiro, Renegado também participou da manifestação. Segundo ela, essa "luta não é apenas do povo preto de Betim, mas do povo preto do país". "betim deu um o à frente de muitos municípios e está implementando essas duas leis federais. Estamos aqui comemorando e não brigando para dar continuidade a esse projeto. Estamos aqui falando de história, de reparação, de vidas. Me sinto na obrigação, como homem preto e agente cultural, de fazer parte desta luta, e feliz em saber que a população preta de Betim está pronta para lutar", salientou o rapper.
Líder do Terreiro Caminhos de Ogum, localizado às margens do Rio Paraopeba, na região do Citrolândia, Ramon Nambor, conhecido como Tata Mebagande, afirmou que o ato foi em repúdio a qualquer manifestação de racismo e discurso de ódio. "Querem nos usar como 'cavalo-de-troia', como 'boi de piranha'. Viemos com todos os movimentos, com o apoio da deputada Andréia de Jesus, com representantes de vários segmentos religiosos para dizer que a didática desse material não tem nenhum cunho religioso. Eles não leram todo o conteúdo como nós", ressaltou.
De acordo com o vereador Ricardo Lana (PP), um grupo de parlamentares decidiu procurar o prefeito Heron Guimarães para discutir sobre o tema por ter encontrado, no conteúdo do material didático, pontos que eles não consideram corretos. "O projeto é bom, mas não é perfeito. Ele aborda sobre a história da cultura afro-brasileira e indígena, sim, mas há pontos também religiosos, que não podemos deixar serem ensinado nas escolas para as nossas crianças. O projeto só foi suspenso. Agora vamos dialogar para entrar em um consenso", frisou.
Líder de governo na Câmara, o vereador Tiago Santana (PCdoB) ressaltou que o governo municipal, desde o princípio, esteve aberto e se colocou à disposição de todas as dúvidas sobre o projeto que pudessem surgir. "O projeto Caminhos da Igualdade não tem nenhum cunho religioso. O objetivo apenas é cumprir as diretrizes das leis federais, que determinam a obrigatoriedade de implementação do conteúdo da cultura e da história afro-brasileira e indígena nas escolas públicas e particulares", declarou.
Entenda
O material faz parte do programa Caminhos para Igualdade – Africanidades e Povos Originários na Educação, desenvolvido pela Prefeitura de Betim com base nas leis federais nº 10.639/03 e nº 11.645/08, que tornam obrigatória a inclusão da história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo escolar.
Em nota oficial, a prefeitura informou que o programa foi estruturado por meio de decreto municipal com o objetivo de “combater o racismo, o preconceito e as injúrias raciais no ambiente escolar”, promovendo o respeito à diversidade cultural e histórica dos povos que ajudaram a construir o Brasil. A gestão também reforçou que o conteúdo tem caráter exclusivamente pedagógico e que “não há qualquer vínculo com práticas religiosas”.
O prefeito Heron Guimarães (União Brasil) e a secretária municipal de Educação, Marilene Pimenta, se reuniram recentemente com vereadores para prestar esclarecimentos. Segundo a nota, a prefeitura decidiu adiar o início da distribuição dos materiais “em respeito ao diálogo democrático e à transparência”, com o objetivo de esclarecer dúvidas e buscar um entendimento coletivo.
Para isso, foi convidado o professor Natanael dos Santos, especialista no tema e um dos responsáveis pela elaboração pedagógica do programa, para uma reunião com os parlamentares nos próximos dias. A expectativa é de que o encontro ajude a destravar a implementação do material nas escolas.